Carta psicografada de uma vampira

11/03/2010 Isabela Bracher 0 Comments

  Enquanto drenava seu sangue, senti remorso pela primeira vez. Seus olhos azuis me olhavam confusos e sua respiração era ofegante. Como todo ser humano, ele não fazia idéia do que estava acontecendo. Pelo que diziam, devia estar até gostando, o que só tornava a situação pior pra mim.
  Eu sou uma vampira sem coração e que nunca sentou nem um pingo de remorso, é o mesmo que caçar algum animal pra comer, a única diferença é que às fezes esses animais são mais porcos que os próprios porcos no chiqueiro. Mas aquele humanozinho estranho e despenteado me fez sentir mal, como se aquilo fosse uma coisa muito errada de se fazer.
  Antes que meus pensamentos me deixassem mais confusa, rapidamente me afastei dele. Era tarde da noite, e estávamos em um parque deserto. Ótimo lugar para se alimentar, sem ninguém ouvindo ou vendo nada. E do jeito que as coisas andavam, capaz de atribuir aquilo a algum esquilo radioativo ou qualquer coisa do gênero. Ou iriam, se eu terminasse meu jantar.
  - O que aconteceu? – perguntou Sebastien com a mão no pescoço, onde eu havia mordido a pouco tempo.
  - O que você fazia por aqui, no meio da noite, em um lugar deserto?
  - Provavelmente o mesmo que você, só pensando na vida. – respondeu, virando-se para a grama onde estava sentado.
  - Se eu tivesse uma vida. Quer saber mesmo o que aconteceu aqui?
  Os olhos de Sebastien brilhavam quando olhou pra mim, parte da atração que os vampiros exercem sobre os seres humanos. Mas aquele olhar era diferente dos outros, que procuravam prazer e vida fácil. Eram olhos ingênuos, e realmente interessados não em conhecer meu corpo, mas minha alma. E acho que aquele humanozinho tinha mais poder que eu porque ele me fez pensar todas essas coisas gays e tudo o mais!
  - Eu quase te matei, e te condenei a uma semi-vida amaldiçoada. – me senti envergonhada falando essas coisas pra ele, principalmente porque ninguém acreditaria nisso. Humanos céticos, só acreditam no que a ciência consegue provar.
 - Sério? Eu não acho. – ele me olhava de lado, com um sorriso no rosto.
  - Você não entende. Eu sou horrível, e te tornei horrível também! Você é um humano bom, se fosse como eu teria feito o que é certo. Teria você mesmo pegado a estaca.  – abaixei os olhos e olhei para os meus pés. Se vampiros chorassem, eu teria secado em lágrimas naquele momento. Sempre achei tão legal ser vampira, a fodona que consegue fazer de tudo, mas agora eu só sentia vergonha por ter tirado tantas vidas.
  Sebastien se ajoelhou na minha frente e levantou a minha cabeça, ficando na altura dos meus olhos.
  - Eu não estou entendendo nada do que você está dizendo, mas não acho que você é má. Se fosse mesmo tão má, teria me matado, como disse que quase fez. Não que fosse um gesto de muita bondade, eu sou só um carinha por aí que nunca fez nada de mais. O que quer que você tenha feito, você se arrependeu agora, e isso é uma prova de bondade quase tão grande quanto não fazer.
  Senti meus olhos molhados, e poderia jurar que era sangue. O sangue de Sebastien, que eu havia acabado de provar.Me senti humana, uma sensação que nem me lembrava que existia. Tudo ficou mais bonito, mais cheiroso, mesmo sendo exatamente do mesmo jeito que era antes. E eu abracei Sebastien, no momento em que o sol nasceu, e que em pouco tempo nos fez virar areia, soprada pelo vento.

-Bells

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